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Apesar da crise, construção civil projeta crescimento de 15%

Retração de 0,2% da economia brasileira no primeiro trimestre não desanima o setor, que registrou avanço de vendas e lançamentos, além de expansão de financiamentos


O desempenho da economia brasileira neste ano tem sido decepcionante para muitos setores, mas nem todas as notícias são negativas para a construção civil. Um dos mais importantes geradores de emprego e riqueza no país, o mercado imobiliário dá sinais claros e consistentes de crescimento, tanto em vendas quanto em lançamentos de empreendimentos.

Segundo a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (Cbic), o número de contratos para aquisição de imóveis residenciais avançou 9,7% nos três primeiros meses do ano na comparação com o mesmo período de 2018.

Foram vendidos 28,7 mil imóveis, ante 26,1 mil de janeiro a março do ano anterior. Já o total de lançamentos no mesmo trimestre registrou alta de 4,2%, com 14,7 mil unidades em todo o país.

Embora o aparente descolamento entre a indústria da construção e a economia como um todo seja motivo de festa para as empresas do setor, a comemoração está sendo discreta. É consenso que uma eventual demora na recuperação da atividade econômica, em razão de atrasos na aprovação das reformas, pode comprometer a performance do setor imobiliário nos próximos meses.

“O resultado é positivo e, sem dúvida, deve ser comemorado, mas, dada a queda que o setor enfrentou durante a recessão, a fraqueza do mercado no ano passado e a esperança de que a eleição reduzisse as incertezas, a expectativa era de que as vendas estivessem crescendo acima 15%”, diz José Carlos Martins, presidente da Cbic. “As construtoras esperavam que, passadas as incertezas de 2018, a agenda de reformas seria tocada com prioridade, a economia embalaria e o primeiro trimestre seria melhor.”

Embora com cautela, a previsão para o crescimento do setor da construção civil, neste ano, é de crescimento robusto. A Cbic estima aumento de 10% a 15% nas vendas no fechamento de 2019, puxado pelo segmento de imóveis de médio e alto padrão, no qual as moradias são financiadas por fundos que utilizam recursos da poupança.

Os números endossam essa perspectiva. Os financiamentos imobiliários com recursos das cadernetas do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE) atingiram R$ 5,77 bilhões em abril último, expansão de 2,2% em relação ao mês anterior e de 40,3% perante abril de 2018.

No primeiro quadrimestre de 2019, foram aplicados R$ 21,4 bilhões na aquisição e construção de imóveis com recursos do SBPE, elevação de 39,7% em relação ao mesmo período do ano passado. 

No acumulado de 12 meses (maio de 2018 a abril de 2019), os empréstimos de R$ 63,5 bilhões para aquisição e construção de imóveis com recursos do SBPE asseguraram elevação de 40,2% frente ao apurado nos 12 meses anteriores.

No segmento do programa Minha casa minha vida, de subsídio à moradias populares, que contam com financiamento por meio de recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), o ritmo dos contratos deve permanecer estável, considerando que o orçamento do fundo ficou estagnado do ano passado para cá. “Quem vai puxar o crescimento é a habitação de mercado médio e alto padrão”, diz o presidente da Comissão Imobiliária da CBIC, Celso Petrucci.

Baixa renda

Isso não significa que os segmentos de imóveis populares ficarão fora do cenário de recuperação da construção civil. Prova disso é a mineira MRV Engenharia, maior construtora da América Latina e líder nesse segmento. Os lançamentos da empresa cresceram 35,9% no primeiro trimestre na comparação com igual intervalo do ano passado, com R$ 1,094 bilhão.

De janeiro a março, as vendas líquidas aumentaram 6%, para R$ 1,309 bilhão. “Nosso primeiro trimestre foi muito bom”, diz o copresidente da MRV, Rafael Menin. “Gostaríamos de ter começado o ano pisando no acelerador, mas deixamos de reconhecer um volume grande de vendas por conta de atrasos no processo de repasses e na contratação de financiamentos à produção decorrentes da transição de governo.”

De acordo com Menin, o principal banco com atuação no Minha casa, minha vida, a Caixa Econômica Federal, realizou poucos repasses até fevereiro. E como a MRV pratica o modelo de venda garantida, na qual operação é registrada somente após o repasse, parte do que foi vendido não foi contabilizado dentro do trimestre.

“Estamos mais otimistas com o segundo trimestre e esperamos um primeiro semestre melhor do que o mesmo período do ano passado. Vamos lançar mais e produzir mais do que no ciclo anterior”, garante Menin. No primeiro trimestre, a MRV produziu 9.880 unidades, com alta de 24,1%, na comparação anual. Assim como a MRV, algumas empresas estão enxergando em seus números a melhora do setor imobiliário. 

“Dobramos o número de imóveis vendidos entre janeiro a abril, em relação a 2018. A expectativa era triplicarmos, mas foi um resultado expressivo”, afirma Marcos Bigucci, da construtora M.Bigucci, sediada no ABC Paulista. “Reconheço que o ano não começou tão bem como esperávamos, mas acredito que estamos no caminho certo.”

Venda de material tem pequena reação

O crescimento das vendas e o aumento do número de lançamentos de imóveis estão influenciando positivamente outros setores, principalmente o de materiais de construção. As vendas de cimento, por exemplo, um dos principais insumos desse mercado, voltaram a crescer, de acordo com o Sindicato Nacional da Indústria de Cimento (SNIC).

Somente em abril último, 4,4 milhões de toneladas do produto foram comercializadas no país, variação de 0,2% em relação ao mesmo mês de 2018. No acumulado de janeiro a abril, 17 milhões de toneladas foram comercializadas, acréscimo de 0,9% sobre o mesmo período do ano anterior.

Segundo o presidente da entidade, Paulo Camilo Vargas Penna, mesmo tendo apresentado ínício de ano positivo, o setor segue com cautela nas projeções, já que os indicadores econômicos ainda não apontam para uma trajetória definida. De qualquer maneira, para ele, há sim indícios de recuperação, que pode se confirmar numa conjunção de alguns fatores.

“A aprovação da reforma da Previdência, junto de outras medidas pró-mercado, suficientes para estabilizar a relação entre dívida e PIB, são fatores que podem deixar o ambiente ainda mais promissor”, afirma o executivo, que também preside a Associação Brasileira de Cimento Portland (ABCP). “De qualquer forma, no nosso cenário de referência, mantemos a projeção de crescimento de 3% para 2019, contando também com um segundo semestre mais forte.”

Outro dado que atesta um começo mais otimista de 2019 no segmento vem do Sindicato da Indústria da Construção do Estado de São Paulo (Sinduscon-SP). De acordo com levantamento da entidade, o número de postos de trabalho na construção civil brasileira subiu 1,02% no primeiro trimestre do ano, em comparação com o mesmo período de 2018.

Ao final de março, o setor empregava mais de 2.295 milhões de trabalhadores. “Está havendo, claramente, um aumento do emprego na construção civil em todo o Brasil, embora em um ritmo menor do que o esperado”, afirma o presidente do Sinduscon-SP, Odair Senra.


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